Tenet, o mais novo longa do diretor Christopher Nolan, amado e odiado pela crítica no mundo todo, chega ao Brasil liderando a bilheteria nacional. Considerado uma das estreias mais aguardadas (e mais adiadas) de 2020, a repercussão de espectadores no estrangeiro tem sido maior do que nos EUA, levando em conta que na data de estreia nas cidades norte-americanas, o país ainda encontrava-se com um terço dos cinemas fechados. Por aqui, apesar de divergirem as opiniões, o filme tem atraído o público mais fanático pelo diretor e, indiretamente abocanha aqueles que estão saudosos das sessões de quarta-feira à noite – meu dia favorito para idas ao cinema.

Nunca fui muito fã do Nolan, confesso; minha porta de entrada para sua filmografia foi Inception (“A Origem”, no Brasil), em 2010, e provavelmente levei uns bons anos para assistir novamente algo realizado pelo diretor, quando em 2018 vi Dunkirk numa sessão espetacular do Shell Open Air, evento de cinema ao ar livre com uma das maiores telas do mundo e um som – digamos, vulcânico! Curiosamente, só fui assistir Memento (em port., “Amnésia”) alguns meses atrás quando li sobre a estreia de Tenet e me dei conta de que só havia assistido exatos dois filmes daquele que para alguns é o ‘deus’ do cinema americano. Ocorre que nem meus três principais motivos para não pagar para ver Tenet (1. Detesto filme de ação, 2. Fiz a besteira de ler uma crítica no El País que retratava bem pessimamente a obra e 3. Síndrome de underground com coisas mainstream) foram suficientes para aplacar a curiosidade... E lá fui eu enfrentar 2h e meia de Nolan.

Considerado um suco concentrado do diretor, Tenet traz a história de dois agentes secretos, protagonizado por John David Washington (Infiltrado na Klan) e Robert Pattinson (The Batman), que tentam impedir um evento catastrófico de pôr fim à humanidade. Mais uma vez, o diretor imerge na construção narrativa que provoca os limites lineares do tempo e desafia a ideia de realidade. Há um complexo fio que conduz a missão dos personagens e, sem dúvida, isso instiga o espectador a desvendar o enigma desta jornada. O filme começa com uma sequência exuberante que se passa num espaço de um teatro lotado (gatilho!) esperando o início da apresentação de uma orquestra. Neste momento, há uma sensação de que o longa promete uma dose colossal de emoção, mas que no decorrer da história vai frustrando cada vez mais pela falta de empatia com as particularidades da trama central.

De certa forma, Nolan deixa claro que opta por focar na densidade do conceito de Tenet ao apresentar motivações empobrecidas dos personagens que tem suas angústias e fragilidades pouco expostas. Para quem é fã do diretor, este não parece ser exatamente um problema – já que as camadas superficialmente desenvolvidas sobre eles nada influenciam na missão apocalíptica. Contudo, a carga demasiada de ficção cientifica misturado com física quântica deixa o roteiro confuso, apático e sem sentido. Ao contrário dos filmes de 007, Batman ou outros “heróis messiânicos”, vemos um espetáculo de explosões e movimentos, mas que nada tocam, pois não somos afetados pelas características pessoais dos protagonistas.

O mais próximo que o filme consegue sensibilizar é se fizermos a interpretação de que o personagem de Pattinson, Neil, seria, na verdade, uma espécie de resposta dentro do esquema de palíndromo (palavras que se mantêm iguais se lidas de trás para frente, como “ovo” e “arara”) cujo título do filme faz referência, T-e-n-e-t. O fato é que essa charada demanda uma visão apurada dos filmes de ação e ao meu ver, só quem se liga muito no gênero vai matar a questão. Nesse caso, assisti ao longa acompanhada de um amigo super nerd e que nos créditos finais me perguntou se eu tinha entendido o final, pois segundo sua possível análise, Neil seria o personagem que se utiliza da viagem de trás para a frente (não uma viagem no tempo, mas uma fissura no presente) com um objetivo genuíno e potente numa perspectiva sensível.

De qualquer forma, e teremos de parar por aqui por motivos de spoiler, Tenet vem recebendo duras críticas por parte das análises justamente pelo enredo labiríntico; parece que os próprios atores se viam sem saber para onde diabos o filme estava indo durante as gravações. Além do excesso de especulações em torno do longa antes mesmo de sua estreia, (os protagonistas, por exemplo, só puderam ler ao roteiro do filme numa sala fechada dentro dos estúdios da Warner), se as reações a história são parte de um mérito ou desprestígio ao cinema de Nolan, resta-nos esperar Tenet decantar no imaginário dos espectadores menos apaixonados e talvez apreciar o filme pela ótica técnica e visual, ambiciosamente concebida, o que deve garantir a vitória de Nolan na próxima temporada de premiações.

O público mais ‘desavisado’ deve sair do cinema um pouco cansado, sem entender muita coisa, mas tocado principalmente pela personagem Kat, interpretada por Elizabeth Debicki, que é quem realmente consegue entregar um senso de vulnerabilidade a narrativa. Há trechos dos diálogos interessantes e que dão uma dinâmica hipoteticamente mais compreensível, o que pode atrair o retorno do público ao cinema pós pandemia e agradar grande parte de quem esperava pouco. A crise na indústria do cinema agravada pelo coronavírus certamente não terá rebento de salvação pelas mãos do diretor britânico, mas promete retomar a movimentação nas salas e arrecadar um valor considerável de bilheteria.

 

(Sobe créditos finais).

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