Diversidade

Projeto “Eu sou o meu próprio lar”, da fotógrafa e psicóloga Bruna Bardi, exalta o amor próprio por meio de ensaios fotográficos

por Layse Barnabé de Moraes 23.01.19

A psicóloga e fotógrafa Bruna Bardi começou a estruturar o projeto “Eu sou o meu próprio lar” em setembro do ano passado, em novembro atendeu o primeiro grupo de mulheres e desde então divide os resultados iniciais no seu Instagram @artedoscorpos.

Segundo ela, as fotos são realizadas individualmente no ambiente de preferência da participante e esse é único momento do projeto que não acontece em grupo. “Se a participante assim preferir, temos uma prévia conversa para que ela possa falar sobre seus sentimentos antes da realização do ensaio e tentar reduzir a sua ansiedade. Dou também um tempo para que ela possa tentar relaxar, pensar em tudo o que foi discutido e falado nas sessões em grupo, refletir sobre o significado da sua relação corporal e se conectar com o próprio corpo. O local de realização do ensaio fotográfico fica a critério da participante. Sempre deixo claro que o ensaio acontece da maneira que ela se sentir mais confortável, prezando sempre pelo respeito à individualidade de cada uma. Cada ser humano é único e possui a sua subjetividade, não cabendo padronizações em inúmeras situações. Portanto, ela realiza no ambiente que achar mais apropriado e com as roupas que se sentir mais à vontade (pode ser de roupa, pode ser de lingerie, pode ser nua, pode ser um pouco dos três, pode ser o que ela quiser!) para que assim seu corpo possa se expressar. O intuito do ensaio é fazer com que ele seja construtivo de diversas maneiras na vida das mulheres. Portanto, as fotos são das participantes e elas fazem o que desejarem com elas”, explica ela, que só publica as fotos com autorização prévia de cada participante.


A fotógrafa Bruna Bardi cita “Mulheres que Correm com os Lobos” para explicar um pouco mais sobre a essência do seu projeto:“Uma mulher não pode tornar a cultura mais consciente apenas com a ordem de que se transforme. Ela pode, no entanto, mudar sua própria atitude para consigo mesma, fazendo com que projeções desvalorizadoras simplesmente ricocheteiem. Isso ela consegue ao resgatar seu corpo. Ao não renunciar à alegria do seu corpo natural, ao não “comprar” a ilusão popular de que a felicidade só é concedida àqueles de uma certa configuração ou idade, ao não esperar nem se abster de nada e ao reassumir sua vida verdadeira a plenos pulmões, ela consegue interromper o processo. Essa dinâmica do amor-próprio e da aceitação de si mesma são o que dá início à mudança de atitudes na cultura.” (Foto: Divulgação)

Com o nome inspirado na música da banda Francisco El Hombre, Bruna explica que a principal base do seu projeto diz principalmente sobre se sentir bem na própria pele: “a canção é uma quebra de paradigmas que diz muito em pouquíssimas palavras e que abre espaço para reflexões acerca da sociedade contemporânea, assim como o objetivo do meu projeto. ‘Eu Sou Meu Próprio Lar’ diz respeito à importância do amor-próprio e de sempre buscar se sentir bem consigo mesmo”, reforça ela. Outra inspiração para a Bruna foi a fotógrafa Milena Paulina com seu projeto “Eu, Gorda”, que a fez perceber o quanto a fotografia pode ser benéfica no processo de ressignificação da relação com o próprio corpo e com a própria história, e também o livro “Mulheres que correm com os lobos”, de Clarissa Pinkola Estés.

Apesar do conteúdo que emerge no grupo terapêutico ser sigiloso, Bruna confessa que as reações das fotografadas tem sido extremamente positivas: “O ensaio acaba mexendo com questões internas e elas relatam ser uma experiência libertadora e importante para seu processo de autoaceitação”.

Para além do impacto das fotografadas, o projeto acabou transformando a própria vida da Bruna, não só no aspecto profissional, mas principalmente no pessoal: “Eu aprendo muito com os estudos que faço, em cada sessão e ensaio que acontece e com as trocas extremamente construtivas que ocorrem dentro do projeto. Conheci pessoas maravilhosas através dele e pude me analisar e adquirir ainda mais autoconhecimento depois que dei início a esse trabalho. Além disso, é imensamente gratificante poder fazer alguma diferença na vida dessas mulheres e saber que está valendo a pena o meu esforço para conseguir esses resultados”.

Conversamos com a Bruna sobre motivações, processo terapêutico, arteterapia e a opção de focar o projeto apenas em mulheres. Confira na entrevista e entenda porque o que superficialmente parecem apenas poses são, na verdade, falas do corpo:

 

Desde quando a fotografia existe pra você e como resolveu juntar foto e psicologia? Como essas duas coisas se completam pra você?

Bruna Bardi: A fotografia é uma das minhas paixões desde que me conheço por gente. Sempre levava minha câmera para cima e para baixo para fotografar lugares e pessoas, mas por muito tempo tive isso apenas como um hobby. Foi quando resolvi fazer um curso de fotografia na escola de artes “Primeiro Encontro” que fui me aperfeiçoando e pensando em tornar esse hobby um trabalho. Pensava em ser psicóloga e fotógrafa ao mesmo tempo, tendo o sonho de juntar as duas coisas, mas sem saber como. Quando comecei a estudar mais afundo sobre arteterapia e sobre as formas de intervenção da fotografia no processo terapêutico, percebi que esse sonho poderia se concretizar e a ideia do projeto começou a surgir.

Explica um pouco sobre o que é a arteterapia? Quais são os benefícios?

Bruna Bardi: É um método terapêutico que utiliza as artes como meio de expressão não verbal, favorecendo assim a exploração e comunicação de conteúdos do sujeito que possam estar inconscientes. Elementos da pintura, da música, do teatro, da escrita e dos mais diversos recursos artísticos são usados para catalisar sentimentos e proporcionar ao indivíduo condições para que ele possa externalizar tudo o que o impede de desenvolver melhor o seu autoconhecimento. É extremamente benéfico, pois permite que o paciente exteriorize questões para além da sua linguagem oral e trabalhe conteúdos que a sua psique dá forma quando eles não são possíveis de serem expressos em palavras. No caso do projeto, o ensaio fotográfico entra como uma forma de trabalhar a autoimagem e a relação com o próprio corpo, além de contribuir no procedimento de autodescoberta e autoaceitação quando possibilita a atribuição de significado à imagem e inicia um processo de ressignificação da própria história. É também uma forma de expressão corporal, em que muitas vezes as poses não são apenas poses, são falas do corpo.

 

Por que escolher fazer um projeto voltado para mulheres?

Bruna Bardi: Nós estamos vivendo um processo de reestruturação do que é ser mulher na nossa sociedade, onde há um reposicionamento feminino em vários aspectos de uma só vez. Acho extremamente necessário abrir espaço para discussões, questionamentos e reflexões acerca da sociedade em que estamos inseridas. Além disso, incontáveis mulheres sofrem todos os dias com padrões sociais impostos, transtornos alimentares, depressão, violências físicas e psicológicas, relacionamentos abusivos e diversas outras questões que deixam marcas no psiquismo humano, se fazendo assim de suma relevância haver um espaço de união feminina, de acolhimento do sofrimento alheio, de troca de experiências entre as mulheres, de identificações internas, de respeito às diferenças e trabalho com essas feridas que permanecem e que influenciam diretamente na autoestima. Acredito também que, para dar início a uma revolução externa, é preciso primeiro fazer uma revolução interna. Somos os primeiros a tentar mudar o nosso contexto, e para isso, é necessário o autoconhecimento e a conscientização de si em sua totalidade de defeitos e qualidades que o processo terapêutico pode nos proporcionar.

 

Em um mundo que nos impõe tanto um padrão inalcançável, qual é a importância de um projeto como esse, que retrata mulheres de uma forma mais sincera, sem edições?

Bruna Bardi: Uma das características marcantes da sociedade de hoje é que as pessoas são percebidas por aquilo que aparentam ser e não pelo que realmente são, sendo a aparência muitas vezes mais importante do que os conteúdos internos. A cultura produz ânsias e desejos e reforça imagens padronizando corpos. Há um exagerado destaque dos conteúdos externos dos indivíduos e uma valorização exacerbada das questões estéticas que refletem o padrão corporal real de uma minoria da população, porém desejado pela maioria. Dessa forma, enaltecimento ao corpo com forte apelo ao consumismo faz com que os sujeitos tenham dificuldade de aceitar sua própria imagem e se distanciem de sua subjetividade e modelo particular de vivenciar sua relação corporal, dependendo da aprovação social de sua conduta a todo momento e querendo modificar a sua aparência a todo custo. A imagem do corpo tem então intenso impacto sobre a subjetividade das pessoas e esse projeto se faz necessário para abrir espaço para esse tipo de reflexão e questionamentos acerca do que é imposto, para acolher o sofrimento alheio que essas imposições sociais causam e para produzir imagens que não reflitam um padrão, e sim celebrem a diversidade humana, as singularidades de cada um e englobem o ser humano dentro da sua totalidade de defeitos e qualidades. Aprendi que o mais importante é não estabelecer verdades e sim levantar perguntas para tudo o que nos rodeia. É questionar o mundo à nossa volta e principalmente o nosso mundo interno para adquirirmos autoconhecimento, conscientização sobre nós mesmos, para conseguirmos mudar o que precisa ser mudado, aceitar o que não é passível de ser modificado e buscar viver a vida de uma forma mais saudável.

 


 

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